Culpa e Inocência nos Relacionamentos

blog_18_02_postAs relações humanas começam com o dar e o tomar. Do mesmo modo, com o dar e o tomar começam também nossas experiências de culpa e inocência, pois quem dá tem também direito de reivindicar, e quem toma se sente obrigado. A reivindicação de um lado e a obrigação, de outro, constituem para toda relação o modelo básico de culpa e inocência. Esse modelo está a serviço da troca entre o dar e o tomar. Aqueles que dão e aqueles que tomam não descansam até que se chegue a um equilíbrio. Isto significa que aquele que toma tem que ter uma chance de dar e aquele que dá tem igualmente a obrigação de tomar. Ilustro isso com um exemplo:

Um missionário na África estava sendo transferido para outra região. Na manhã de sua partida, recebeu a visita de um homem. Ele fizera uma longa caminhada para se despedir do missionário e oferecer-lhe uma pequena quantia em dinheiro, equivalente a alguns centavos de dólar. O missionário percebeu que o homem queria agradecer- lhe por tê-lo visitado muitas vezes, quando estivera doente. Sabia que aquela quantia era uma grande soma para ele. Assim, sentiu-se inclinado a devolver-lhe o dinheiro e ainda a dar-lhe mais algum de volta, porém, pensou melhor, pegou o dinheiro e agradeceu. Quando recebemos algo dos outros, por mais belo que seja, perdemos nossa independência e inocência. Ao receber algo, nos sentimos em dívida com o doador. Experimentamos essa dívida como desconforto e pressão, e procuramos nos livrar desta pressão dando algo de volta. Nada se toma sem esse preço. A inocência, ao contrário, é experimentada como prazer. Nós a sentimos como reivindicação quando damos sem ter recebido ou quando damos mais do que recebemos. E a sentimos como leveza e liberdade quando não estamos obrigados a nada, por exemplo, quando de nada precisamos ou nada recebemos de um modo especial, quando, tendo recebido, também retribuímos na mesma medida. Conhecemos três atitudes típicas para alcançar ou manter essa condição de inocência.

A primeira é: O desligamento Alguns pretendem preservar a inocência negando-se a entrar no jogo. Preferem fechar-se a tomar, pois não ficam obrigados. Essa é a inocência dos que não jogam, não querem sujar as mãos e, por isso, frequentemente se consideram especiais ou melhores. Entretanto, eles vivem restritos e, nessa mesma medida, sentem-se descontentes e vazios. Encontramos essa atitude em muitos depressivos. Sua recusa em tomar se dirige sobretudo a um dos pais ou a ambos. Posteriormente estendem essa recusa às outras relações e às coisas boas deste mundo. Essas pessoas justificam essa recusa alegando que o que receberam não foi o certo ou não foi o suficiente. Outros justificam sua recusa, apelando para os defeitos da pessoa que deu. Entretanto, o resultado é sempre o mesmo: permanecem paralisados e sentem-se vazios. A abundância O efeito oposto pode ser notado nas pessoas que conseguem tomar seus pais como são, e tudo o mais que eles lhes dão. Experimentam essa atitude como um afluxo constante de energia e felicidade, que também os capacita a manter outras relações, onde também dão e recebem abundantemente. O ideal de um bom ajudante

Uma segunda maneira de experimentar inocência é a reivindicação que faço em relação a outros, quando lhes dei mais do que eles a mim. Esse tipo de inocência é geralmente passageira, pois logo que recebo do outro uma compensação, a minha reivindicação cessa. Algumas pessoas, porém, preferem obstinar-se em seu direito de cobrar a receberem de volta algo do outro. Adotam o lema: “É melhor você ficar devendo do que eu”. Essa postura, encontrada em muitos idealistas, é conhecida como “o ideal de um bom ajudante”. Contudo, tal liberdade de obrigação é inimiga dos relacionamentos, pois aquele que se limita a dar apega-se a uma superioridade que só pode ser transitória, pois de outra maneira não existe equilíbrio no relacionamento. E os outros não querem ter mais nada daquele que não quer tomar nada, afastam-se ou ficam zangados com ele. Esses “ajudantes” permanecem solitários e frequentemente se tornam amargos.

A troca é a terceira e mais bela forma de experimentar inocência é o alívio depois da retribuição, quando igualmente tomamos e demos. Essa alternância entre o dar e o tomar se processa entre os envolvidos: quem recebe algo de alguém retribui-lhe com algo equivalente. O que importa, entretanto, não é apenas a troca, mas o quanto se investe. Um pequeno investimento no dar e tomar traz um pequeno ganho, mas um grande investimento enriquece e é acompanhado por uma sensação de abundância e felicidade. Essa felicidade não nos é dada de graça, ela se constrói. Quando investimos muito, temos uma sensação de leveza e liberdade, de justiça e paz. Dentre as possibilidades de experimentar inocência, esta é, sem dúvida, a mais libertadora. É uma inocência com satisfação.

Fonte: O Amor do Espirito – Por Bert Hellinger

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